domingo, 9 de setembro de 2012

Kelvin e o seu jeito de moleque com bola. (Crónica)




O homem e o seu percurso:

No primeiro dia de Junho de 1993, em Curitiba, capital do estado do Paraná, nasce mais um moleque bom de bola. Kelvin é a nova alegria da família Oliveira.

Cresce na sua Curitiba e vive uma infância feliz e despreocupada. O futebol na rua, livre e indomável, alimenta o espírito de Kelvin e domestica o seu pé esquerdo às vontades e caprichos da bola. Foi ali, por entre os pés descalços e as balizas de improviso, que o seu futebol ganhou tempero e gosto. O tempero e o gosto do Barreado do Paraná, feito na rua e em pote de barro. 

Não há escola de bola como a alegria da “criançada” crescendo sem cartilha, sem horário e sem uniforme.




Kelvin deu logo sinais de talento precoce. O futebol de Kelvin sai da rua e passa para o futsal. Espaço reduzido e muito contacto com a bola, perfeito para continuar a evoluir. Inicia-se, aos 6 anos de idade, no futsal de uma associação da qual o seu pai é sócio. Kelvin chama a atenção de Castro, um ex-central do Paraná Clube, que o leva para futsal do histórico clube de Curitiba. Chega ao Tricolor da Vila com 9 anos e burila as suas capacidades no futsal por dois anos mais. Aos 11 anos de idade, Kelvin passa para o futebol de 11 do Paraná Clube. Os centros de treino do Boqueirão e do Ninho da Gralha são as próximas casas do talento paranaense. 




Na sua primeira abordagem ao futebol de onze, Kelvin ocupa a posição de lateral esquerdo. Escasseavam esquerdinos e Kelvin foi o escolhido, mas o seu futebol vibrante e técnico cedo condenaram a adaptação a uma existência efémera. Kelvin fixa-se, rapidamente, a médio ofensivo e joga quase sempre um escalão acima da sua idade. Aos 16 anos, Kelvin já integrava a equipa júnior do Tricolor da Vila.

À custa do seu talento, a ascensão foi vertiginosa, mas a partir daqui, será meteórica!

A situação da equipa sénior do Paraná Clube na Série B do Brasileirão não estava fácil. Roberto Cavalo, treinador da equipa sénior do Paraná Clube, procurava reforçar a equipa. Sem possibilidades económicas, o Paraná Clube estava cingido a procurar talento nos seus escalões de formação. Roberto Cavalo assiste a um jogo da equipa júnior e apercebe-se, imediatamente, do talento de Kelvin, já com 17 anos feitos. No fim do jogo, informa Kelvin que no dia seguinte irá treinar com a equipa principal. Kelvin volta a impressionar no treino, a tal ponto, que Roberto Cavalo convoca o jovem para o jogo da equipa sénior marcado para o dia seguinte! Pela frente, um jogo fora frente ao Guaratinguetá (actual Americana), o último classificado. O jogo é difícil e só a meio da segunda parte é que o Tricolor da Vila ganha vantagem no marcador. Com uma magra vantagem e disposto a selar os três pontos, Roberto Cavalo coloca Kelvin em campo aos 86 minutos de jogo. Dois minutos para lá da hora, o Paraná Clube atinge o 0-2. Kelvin marca o golo que assegura três preciosos pontos e o Paraná Clube respira melhor na série B. 

Convencido pela estreia, Roberto Cavalo decide promover Kelvin, em definitivo, à equipa principal.

 Nos três jogos seguintes é suplente utilizado. Ao quarto jogo na equipa principal, já é titular e não mais larga essa condição. No total, Kelvin faz 7 jogos pela equipa principal do Paraná Clube na recta final da série B do Brasileirão. Kelvin, aos 17 anos, é o novo dono da camisa 10 da Tricolor da Vila e a revelação da série B!
Na época seguinte, há muita agitação em torno do Kelvin. O seu talento não passara despercebido. A abrir as “hostilidades”, na pré-época, o técnico do Atlético Mineiro – Dorival Jr. – aponta Kelvin como uma das 5 revelações dos campeonatos Brasileiros para 2011 e tenta concretizar a sua transferência para Belo Horizonte.

O Paraná Clube resiste ao assédio da equipa da série A do Brasileirão e tenta mater, a todo o custo, Kelvin para a sua campanha na série B de 2011. Logo depois, Ney Franco convoca Kelvin para a selecção Brasileira Sub18 para actuar na Taça Internacional do Mediterrâneo. Kelvin soma boas exibições e a selecção Brasileira chega à final, onde bate a selecção Mexicana, com Kelvin em excelente plano. De volta a Curitiba, o assédio não cessa. Desta vez, é o Palmeiras de Scolari que tenta agarrar o talento. Kelvin ausenta-se dos treinos devido ao constante assédio e ao processo de renovação em curso com o Paraná Clube que teima em não se efectivar. O seu futebol é raramente visto no Vila Capanema pelos adeptos do Tricolor da Vila. 





Após um longo impasse, Kelvin renova pelo Paraná Clube, mas não duraria muito no Tricolor. O FC Porto faz uma abordagem decidida e um entendimento é estabelecido entre os dois clubes. Kelvin permanece em Curitiba até Junho de 2011, altura em que terá 18 anos. A recuperar do tempo perdido e com algumas lesões, Kelvin despede-se de Curitiba com 5 jogos disputados pelo Tricolor da Vila em 2011.

Uma gestação perfeita. Nove meses separam a estreia de Kelvin na equipa principal do Paraná Clube e a sua chegada à Invicta!





No FC Porto, efectua a pré-época em 2011/2012 e encanta com o seu futebol de ginga. Na memória dos adeptos portistas ficou o seu desempenho no jogo de apresentação para a época 2011/2012 frente ao Peñarol. Não obstante, o FC Porto opta por um crescimento sustentado do seu jovem talento. Previsivelmente, as oportunidades no Dragão seriam escassas. O FC Porto opta, então, por colocar Kelvin nas mãos de Carlos Brito.

 Em Vila do Conde seria confrontado com as agruras do futebol Europeu e com a luta constante por pontos, mas competentemente amparado pelas mãos sábias de quem muito sabe de futebol. A adaptação foi difícil, como seria de prever. Ainda assim, faz 27 jogos oficiais pelo Rio Ave, tendo sido titular em 14 jogos. Conquista a massa adepta Vilacondense pela sua alegria contagiante e pelo futebol de ginga que apresenta. Forma com Atsu uma dupla de alas que se revelaria determinante para a permanência na primeira liga da equipa de Carlos Brito.

Está, agora, de volta ao FC Porto. Sempre de sorriso nos lábios e com o seu jeito de moleque com bola. A pré-época volta a ser muito satisfatória e Vítor Pereira, desta vez, opta por manter Kelvin no plantel. Com a saída de Hulk, abre-se mais espaço para a afirmação do menino do Paraná. E Kelvin tem talento para surpreender.


A análise ao jogador:

Kelvin é futebol no pé. É drible, movimento espontâneo, o imprevisto e um sorriso a acompanhar. É um jogador muito forte no um-para-um.

Kelvin precisa de mais futebol na cabeça (e não só no pé). Ser mais racional, mais frio, mais efectivo e mais objectivo. Nunca perder o tempero e o sabor do seu futebol, mas saber que os jogos são para ganhar e não só para entreter. Crescer no futebol sem bola. O jogo não pára só porque não tem a posse de bola.

Tem condições técnicas excepcionais. Dentro do campeonato Português, são poucos os jogadores que têm uma relação mais íntima com a bola. Fisicamente, tem muito trabalho pela frente, mas tem uma boa base. O seu futebol não está assente numa fragilidade física insuperável, pelo contrário, tem velocidade e condições físicas para resistir ao choque. Precisa de ganhar ainda mais massa muscular, mais autoconfiança e mais manha para saber ganhar esses duelos.







Cresceu muito tacticamente no Rio Ave de Carlos Brito e é hoje um jogador bem mais atento ao momento defensivo. Carlos Brito chegou a afirmar que Kelvin não jogava mais porque ainda não entendia o processo defensivo. A sua mensagem acertou no alvo e Kelvin cresceu.





Outra vantagem do futebol de Kelvin é sua plasticidade. É um jogador confortável no jogo exterior e no jogo interior. No Paraná Clube, assumiu uma posição mais central de apoio ao finalizador. Era o responsável pelo último passe e pela criação de jogo. No Rio Ave, foi um jogador de flanco, um “rompedor” de defesas. Basta recordar o seu grande jogo, em Vila do Conde, frente aos de vermelho da segunda circular. É nesta posição onde Kelvin retira o melhor do seu futebol.

Com a saída de Hulk abre-se uma vaga na frente de ataque. É uma oportunidade para os três jovens talentos (Atsu, Iturbe e Kelvin) lutarem por um lugar ao sol. Atsu até já é titular, mas até para ele a tarefa sem Hulk ficou mais fácil.

Destes “três mosqueteiros”, o que tem menos cartel entre a massa adepta portista é Kelvin. No entanto, não creio que seja o que tenha menor potencial. Pelo contrário! Muito pelo contrário!

Kelvin tem potencial para ser uma referência no FC Porto. Se o vai ser, veremos. Depende dele, do seu esforço e do trabalho que fizerem com ele. Talento tem e é transbordante.

Termino com duas citações de dois ex-treinadores de Kelvin:

• Roberto Cavalo: “Joga como médio-ofensivo ou como segundo avançado. Trata a bola com carinho e nota-se que gosta do que faz. Ainda é muito novo, mas é extremamente responsável tanto fora como dentro das quatro linhas. É canhoto, tem muita habilidade, é rápido e tem todas as condições para vir a ser chamado à selecção brasileira. Também faz golos, porque remata muito bem e é bom a cobrar faltas. É um jogador diferente de todos os outros, tem muita qualidade técnica e o seu pé esquerdo foi tocado por Deus.”

• Carlos Brito: “É um miúdo com qualidade, apesar de ser ainda muito jovem. Tem capacidade para aparecer já no FC Porto. Agora, não podemos esquecer que tem apenas 19 anos. Ele tem uma grande qualidade: não se intimida, esteja a jogar para 100 pessoas ou para 20 mil. Nunca se esconde, quer estar sempre a aparecer, sempre em jogo. O Kelvin só precisa de aprender a controlar melhor o timing para se desfazer da bola depois de sair da finta. A sua mobilidade também lhe permitirá jogar no centro, mas aí terá menos espaço para a finta.”






Por: Breogán

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