Valha-nos Santa Eulália!
Desde jogo, só sobrevivem duas coisas positivas.
Primeiro, a vitória dentro dos 90 minutos que permite-nos passar à próxima eliminatória. Valha-nos Santa Eulália por isso! Segundo, a conferência de imprensa no final do jogo.
Não pelo tom encrespado. Muito menos pela falsa demonstração de liderança de pseudo murro da mesa e daqui para a frente não vai ser repetível. Todos sabemos, mesmo os que não querem e os que não conseguem ou não podem admitir, que estamos sujeitos a mais jogos assim neste legado. Simplesmente, porque ao contrário de Vila do Conde, Vítor Pereira disse que sabia o porquê deste jogo ter saído como saiu. Mesmo que tenha sido alguém a dizer-lhe o porquê e não fruto do seu próprio pensar. Seria a desgraça se no fim de um jogo destes, contra o adversário que foi (que até apresenta atletas mais anafados que lutadores de sumo), o treinador do FC Porto se sujeitasse ao ridículo de se virar para os jornalistas presentes e dizer que não tinha percebido o que tinha acontecido. Valha-nos Santa Eulália por isso também!
Sendo de autoria própria ou não, o que afirmou Vítor Pereira no final do jogo é verdade. As muitas mexidas e as adaptações exóticas no cerne da equipa só podiam dar o resultado que deram. No fundo, ter rasgo de treinador é percepcionar o improvável antes de acontecer, por maior força de razão, percepcionar por antecipação o óbvio é o “quanto basta” para um bom treinador. Vítor Pereira falhou em ambas. Ao menos no fim, desta vez, diz que percebeu o que correu mal. Temos evolução.
É verdade que este é um jogo de menor interesse numa época que se espera longa e com muitos objectivos para conquistar. É verdade que para o Santa Eulália este era “o jogo” desde a sua fundação. Também sabemos do jogo importante para a Champions que se avizinha e das alterações que se iriam efectuar na equipa, dada a valia do adversário, para rodar plantel. Mas para lá do acesso à próxima eliminatória da Taça de Portugal, este jogo serviria para mais alguma coisa? Sim, serviria. Nestes jogos ganham-se jogadores. Nestes jogos ganha-se continuidade.
Que jogador se aproximou do onze inicial no após Santa Eulália? Nenhum. Um plantel tem sempre primeiras e segundas escolhas. É uma lei fundamental do futebol. Quanto maior for o fosso que separa as primeiras escolhas das segundas, mais limitado o plantel se torna e maior é a descrença da equipa e de tudo o que a envolve (adeptos incluídos) quando tem que recorrer às segundas escolhas. Mesmo para os adversários é um critério de motivação. Se os adversários percebem que as segundas escolhas aguentam o nível exibicional da equipa, o suposto “ponto fraco” não existe nas suas cabeças. Mas se, pelo contrário, começam a ganhar crença que quando o FC Porto não apresenta o seu 11 de gala há sérias hipóteses do nível da equipa cair consideravelmente de rendimento, então a motivação para enfrentar o FC Porto é outra.
No após “valha-nos Santa Eulália”, o FC Porto não “ganhou” nenhum jogador, como até pode ter “perdido”, irremediavelmente, alguns deles.
Quanto à continuidade, é um aspecto ainda mais abrangente. Envolve a equipa no seu todo. Estes jogos são um teste à continuidade da equipa. Não se exige que o FC Porto goleie por muitos, nem se exige, sequer, que o FC Porto goleie. Exige-se ao FC Porto que faça um jogo sólido, inquestionável e coerente. Exigia-se ao FC Porto que não desse hipóteses ao Santa Eulália, que controlasse o jogo e não que estivesse sujeito a uma anedota no fim do jogo, como, ainda por cima, esteve quase a acontecer. É esta continuidade exibicional que dá crescimento sustentado à equipa. Não há equipa que cresça numa montanha russa exibicional.
É esta continuidade que torna a equipa maquinal. Mesmo mudando algumas peças, o rendimento é perene. Todas as grandes épocas do FC Porto tiveram esta sustentação. Foram muito poucas as interrupções na continuidade exibicional da equipa. Com este legado de Vítor Pereira, nunca se sabe o que vai acontecer a seguir. Sobretudo, nos jogos fora de casa.
Nada do anteriormente escrito respalda ou desculpa a manifesta falta de empenho e de qualidade nas exibições individuais de alguns jogadores. Aliás, é já um sintoma recorrente neste consolado. Nada do anteriormente escrito justifica que um jogador se entregue à miséria do jogo e não tente ser foco de revolta que contagie a equipa. Infelizmente, nem quem jogava dava a volta ao texto, nem quem entrava melhorava o que fosse, nem quem segurava a batuta (?) no banco conseguia sacar uma nota afinada da orquestra!!!
O que é assustador neste jogo é sentir, uma vez mais, que Vítor Pereira não percebe como se articula uma equipa de futebol moderno. Entregar a primeira fase de construção e de pressão no meio campo a Castro e Rolando, um central adaptado e um médio sem andamento para o caudal de jogo que o FC Porto precisa é matar toda a equipa. Os defesas ficam a apanhar jogadores que vencem verticalmente a linha de pressão e os atacantes ficam entregues a tentar o rasgo individual porque não há meio campo que suporte e alimente o jogo ofensivo da equipa.
Imaginem a Fórmula 1. A equipa principal é o melhor carro e no seu centro tem um motor V10. O nosso carro suplente (o que ontem jogou), com umas peças novas à mistura, tem um motor V6, mas Vítor Pereira decide ir mais longe, retira-lhe o motor V6 e coloca um motor de tractor a dois tempos. A partir daqui, não interessa se é Santa Eulália, Apoel, Espinho ou Santa Clara ou outra equipa qualquer. Ou temos alguma peça em superprodução que supere a incapacidade do motor, ou temos um problema que não é ultrapassável no centro mecânico do carro.
Nem tudo foi mau. Houve lances em que se percebeu a qualidade de alguns jogadores, mesmo estando amarrados pela tacanhez colectiva e tolhidos pela indolência individual.
Quanto ao jogo, a primeira parte até começou de forma razoável. Kléber, por duas vezes, tenta o golo nos primeiros 10 minutos. Primeiro, de cabeça, depois de pontapé de bicicleta. O Santa Eulália responde aos 13 minutos e anima-se para o jogo. Entre os 15 e os 20 minutos é Iturbe a ter três boas situações, mas decide sempre mal. Segue-lhe o exemplo Atsu que, aos 22 e aos 30 minutos de jogo, tem duas ocasiões para marcar, mas não é eficaz. No mesmo minuto 30, chega o golo de Danilo, num lance individual e em progressão vertical. Um lance de talento, concluído com classe. Um lance em que a superprodução individual superou o constrangimento no cerne da equipa. Cinco minutos depois, Danilo volta a tentar o remate fora da área, mas o seu remate é defendido. Dois minutos depois, Kleber falha isolado e de forma displicente, após boa tabelinha com Atsu.
A segunda parte foi uma descida às profundezas dos infernos. Logo aos 47 minutos, Fabiano salva o empate. Aos 50 minutos, Kléber volta a ter uma oportunidade e a falhar. Aos 67 minutos surge a única grande oportunidade do FC Porto na segunda parte. Atsu aproveita o atabalhoamento da defensiva contrária e atira à trave. A partir daqui, o FC Porto ausenta-se de campo e o Santa Eulália quase conseguia o seu milagre por duas vezes! Do FC Porto, nada! Um absoluto ZERO! Valeu-nos (que era o) Santa Eulália!
No fim, disse que percebeu. Esperemos que, com a intercessão de Santa Eulália, tenha percebido mesmo.
Pelo menos, já o disse, nem que fosse só da boca para fora e de sobrolho carregado!
O estilo do monólogo final, já não disfarça o que o provoca. Já há muito se sabe que mudar uma equipa por completo, nem dá uma oportunidade a quem entra, como só periga a continuidade da forma da equipa. Ainda por cima, juntar adaptações é do piorio.
Ontem, lembrei-me de Robson. Do que fez no fim de um jogo, em vez de um discurso pretensamente curto e grosso para jornalista ouvir. Mas desta vez, o treinador também tinha que dar umas boas voltas ao campo a correr.
Há sumo para ser extraído, não temos é espremedor.
Análises Individuais:
Fabiano – Mostrou que é opção séria a Helton. Boa defesa aos 47 minutos de jogo.
Danilo – Aos 13 minutos deu demasiado espaço na sua zona e o Santa Eulália aproveitou. Após esse lance, subiu de produção defensivamente e aproveitou o flanco para esticar jogo. Marcou um golo de talento e continuou a produção ofensiva. Aos 61 minutos, passou para o meio campo e perdeu-se naquela confusão. Sem espaço para explodir e atarefado a apagar demasiados fogos.
Quiño – Fez um jogo tímido, mas competente. Foi sério a defender e tentou sair para o ataque. Não merecia ser substituído.
Abdoulaye – Exibição demasiado faca. Cheia de “pecados” que não ganharam contornos mais gravosos porque do outro lado estava uma Santa Eulália. Teve bons cortes, mas displicências monumentais.
Mangala – Demasiado impetuoso, ainda assim, safou-se no meio deste turbilhão. Quando passou para defesa-esquerdo caiu abissalmente de produção e abriu o corredor, até então, bem fechado por Quiño. Terá Vítor Pereira percebido? Não é solução para a ausência de Alex Sandro.
Rolando – Fez uns bons passes, uns cortes aqui e ali, mas não tem dinâmica ou capacidade táctica para ser 6 (quanto mais 8!, como foi algumas vezes). Fez o que podia, o que era pouco para o que a equipa precisava. Quando Vítor Pereira percebeu e o devolveu à sua posição, não deu a tranquilidade ao sector que a equipa precisava.
Castro – Muita corrida, pouca dinâmica. Muito altruísmo, pouca qualidade. O passe nem sempre saiu preciso e raramente vertical. Nunca foi o médio que a equipa precisava. Uma coisa é jogar no Gijón que luta para não descer. Outra bem diferente é jogar num Bicampeão Europeu. Castro não dá o passo em frente.
Kelvin – Um jogo aos repelões. Misturou bons detalhes com longas ausências do jogo. Nota-se que é um jogador com muito futebol para dar. Falta-lhe quem o saiba extrair.
Iturbe – Entrou para o jogo e pensou que a melhor forma de entrar nas contas de Vítor Pereira era voltar a marcar outro golo como fez ao Celta de Vigo na pré-época. Erro tremendo. Perdeu-se e foi humilhantemente vencido lance após lance, até que, chateado com o jogo, desapareceu. Iturbe tem que jogar simples e começar pelo básico. Até lá, não passa de uma promessa. A aposta também tem que ser diferente. Iturbe é para jogar 20 minutos na primeira liga e não os 5 minutos finais.
Atsu – Dos jogadores ofensivos, foi o que fez o melhor jogo. Como todos os outros, sofreu com a ausência de um meio campo competente e abusou do lance individual. Não pode deixar-se contagiar com a onda de elogios que o rodeia. Tem muito que evoluir e precisa de ser bem mais eficaz. Até lá, nada de ganhar tiques de vedeta em campo.
Kléber – Muito bom começo de jogo, terrível e imperdoável perdida, aos 37 minutos, após boa tabela com Atsu. A partir daí, desesperou e desapareceu do jogo. A vida já não lhe corre bem, ao menos que lute para inverter isso. Não era o jogo fácil para ele. O meio campo não existia e os criativos estavam apostados a jogarem sozinhos. Ainda assim, tem que voltar a mostrar a vontade e o empenho que mostrava no Marítimo. Cada lance é o último, ou não vai sobreviver a mais um ano de FC Porto. A apatia com que acaba o jogo é confrangedora.
Miguel Lopes – Má entrada em jogo. Continua a revelar uma arreliante sobranceria defensiva. Ofensivamente, não esteve ao seu nível.
Varela – Mais uma entrada à Varela. Inconsequente e patética.
Sebá – Presente envenenado ter uma estreia assim. Com a equipa a jogar tão mal e sem fio táctico. Mas também não entrou bem. Rapidamente se percebeu que não traria nada de diferente ao jogo.
O que disserem os Intervenientes:
Vítor Pereira:
"Temos que ser muito mais fortes"
Depois da vitória, por 1-0, frente ao Santa Eulália, que garantiu o apuramento do FC Porto para a quarta eliminatória da Taça de Portugal, Vítor Pereira preferiu ser breve, reconhecendo, numa curta declaração, que esperava um desempenho superior da equipa e assumindo, sem qualquer reserva, a sua quota de responsabilidade pela exibição e pelo resultado.
“Assumo completamente as minhas decisões e reconheço que, com tantas mexidas e adaptações na equipa, descaracterizámos o nosso jogo”, disse o treinador dos bicampeões nacionais, admitindo que o FC Porto não apresentou em Vizela a qualidade habitual.
Para valorizar, continuou Vítor Pereira, sobrou-lhe apenas “a passagem à próxima eliminatória” e “o apoio dos adeptos”, que “mereciam outra exibição”. Sem se esquecer de dar os parabéns ao adversário, “que fez um belíssimo jogo e foi ambicioso”, o treinador assumiu ainda que “a conquista da Taça de Portugal é um objectivo da equipa” e que, para o conseguir, terá que se apresentar “muito mais forte já na próxima eliminatória”.
Danilo:
“É natural que tenha sido assim, porque temos um jogo grande na quarta-feira [n.d.r.: FC Porto-Dínamo de Kiev]”, argumentou o lateral direito, que marcou, aos 31 minutos, com o pé esquerdo. “Mas o Santa Eulália também fez um grande trabalho”, prosseguiu. “Dificultou ao máximo, mas acabámos por sair daqui com a vitória e garantir a passagem à próxima eliminatória”.
FICHA DE JOGO:
Santa Eulália-FC Porto, 0-1
Taça de Portugal, terceira eliminatória
20 de Outubro de 2012
Estádio do FC Vizela, em Vizela
Assistência: cerca de 6.000 espectadores
Árbitro: Rui Costa (Porto)
Assistentes: Nuno Manso e Bruno Rodrigues
Quarto árbitro: Ivan Vigário
SANTA EULÁLIA: São Bento; Inácio, Basílio, Filipe Alves e Armando; Hélio, Rui Costa, André Cunha e Nélson (cap.); Carlitos e Zézé
Substituições: Filipe Alves por Benício (65m), Carlitos por Tiago Monteiro (74m) e Zézé por Filipe Magalhães (80m)
Não utilizados: Espinha, Chico, André Monteiro e Tiago
Treinador: João Fernando
FC PORTO: Fabiano; Danilo, Abdoulaye, Mangala e Quiño; Rolando, Castro (cap.) e Kelvin; Atsu, Kleber e Iturbe
Substituições: Kelvin por Miguel Lopes (61m), Quiño por Varela (61m) e Iturbe por Sebá (72m)
Não utilizados: Kadú, Lucho, James e Fernando
Treinador: Vítor Pereira
Ao intervalo: 0-1
Marcador: Danilo (31m)
Por: Breogán
5 comentários:
Boas,
Depois do jogo, estava à espera da crónica. Mais uma vez, concordo com a maior parte. Obviamente, o que mais me preocupa, é a gestão do Porto. Não acho que o VP seja assim tão mau como a maioria o pinta, mas ele já era a pessoa que dava a tactica ao AVB e, resultava. Ninguém passa de cavalo para burro assim. Nem VP nem Sá Pinto etc...
Neste último jogo, apenas devo dizer que o Kelvin mostra ser muito mais do que pintam o Iturbe, este último menino já está a tocar o rótulo de flop, tal como Kléber, que se conformou com a sua entrada para o Porto, seja a sua situação titular, suplente ou simplesmente, encostado...
De qualquer maneira, obrigado e continuem com os posts. Abraço.
Eu acho que o VP pelas declarações finais tinha consciencia que com a equipa apresentada nunca seria uma boa exibição mas também não contaria que a coisa descesse tanto.
Mas de qualquer modo, estou de acordo com o Breogan esta não é a maneira de se ajudar os jovens jogadores,a imporem-se, longe disso.
E aquele meio-campo Rolando,Castro e Kelvin!!!
E já agora qual a melhor posição para o Kelvin?
Pior que a exibiçao, que nao é muito diferente da média do que se tem visto, é a forma como se estao a queimar jogadores jovens, com potencial.
Há treinadores que aparentemente desrespeitam em absoluto certos adversários, como foi o caso de VP no jogo de ontem. Já no tempo de Jesualdo, isso aconteceu, com resultados semelhantes, mas aparentemente nao se aprende com os erros do passado.
Pensam que isto é dar minutos de competiçao aos que nao jogam? Nao, isto é marginaliza-los. Mas o que esperar, quando se pega em 11 jogadores, cujo único critério é nao jogarem com regularidade, e faz-se um 11 titular.
É preciso ensinar os principios básicos a VP e dizer que qualquer que seja a equipa ela tem de ter um principio de organizaçao. E era tao simples, bastava ter incluído 1 central titular, 1 ou 2 médios como Moutinho ou Lucho, e aí sim poderia exigir mais aos restantes.
Enfim, parece existir tanto amadorismo.
Tenho receio que com tantos jovens no plantel principal, que custaram tanto dinheiro, eles sejam descartados de forma muito fácil pelo fraco trabalho que se esta a desenvolver neste momento.
Cumps
Acho que o Kelvin rende mais no flanco. Tem maior liberdade.
Agarra-se demais à bola para poder jogar por dentro. Ainda não é um jogador de levantar a cabeça e dar de primeira. Se evoluir nesse sentido, então sim, fará sentido testá-lo no centro.
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