Asas de borboleta
No futebol, a verdade não anda sempre de braço dado com a
realidade. Tal como na vida, nem sempre o esforço é compensado, nem sempre o
desleixo é penalizado. Tal como no trabalho, nem sempre a dedicação é
reconhecida, nem sempre a incompetência é castigada.
O FC Porto venceu por 3-0 ao Paços de Ferreira, e minha
nossa!, como mente o marcador. Nem o Paços de Ferreira sabe como perdeu por
3-0, nem o FC Porto sabe como ganhou por 3-0.
Adoraria ter aquele discurso de que os campeões também se
fazem em jogos assim. Tivemos estrelinha. Que ganhamos e é o que interessa. Que
após ganharmos sem ler e escrever e por números tão esclarecedores, só podemos
moralizar! Que a sorte não nos abandonou e que estamos no trilho da glória.
Adoraria mentir a mim mesmo. Nem que fosse um pouquinho.
Mas não consigo.
Porque temi mais o empate do Paços de Ferreira do que o
lampião temeu que a cobertura do seu pré-fabricado lhe caísse em cima. Porque
vi uma primeira parte horrenda, onde após razoáveis dez minutos iniciais, o FC
Porto desaparece de campo, diluído pela chuva ou soprado pelo vento. Onde um
Paços de Ferreira na retranca chegava à frente.
Vejo uma equipa sem alma, sem querer. Vejo um FC Porto que
já não só tropeça nas grandes e pequenas pedras do percurso, mas também, nos
seus próprios pés. Vejo um FC Porto colado por cuspe, à espera do milagre ou da
machadada final. Já estamos para lá da metade da época e nem uma ideia de jogo
ainda há. Nem um esboço final de um onze inicial. Creio não estar a ser
exagerado ao dizer que com as excepções de Helton, Jackson e os laterais (e por
quase não terem concorrência), tudo o resto é passível de mudança.
Merecido? Não interessa. É tudo pão para a boca!
O intervalo trouxe um FC Porto mais agressivo, mais
empenhado e mais assustado pelos assobios da bancada. Mas foi tão só isso. É
mais o brio de querer mostrar serviço, que qualquer ideia sólida de jogo. Lá se
foi mastigando o jogo, naquela luta titânica entre o meio campo do FC Porto e o
meio campo do Paços de Ferreira. Eles com medo de atacar e destapar os pés. Nós
a lutar pela bola, mas sem qualquer ideia ofensiva.
Até que minuto a minuto, o Paços de Ferreira foi ousando.
Devem ter pensado: “Querem ver que ainda empatamos?”. E lá se foram soltando.
Arrancada dali, remate de acolá. Andava o Paços de Ferreira mais perto do golo
que o FC Porto.
Até que, já no ocaso do jogo, o Paços de Ferreira lança-se
na busca do ponto e sofre dois golos de rajada. O primeiro, com Fernando a
fazer todo o trabalho de meio campo. Ganha a bola meio campo – recuperação.
Transporta verticalmente e em velocidade – transição. E lança o extremo com um
passe a rasgar – criatividade. O segundo, é um brinde do guarda-redes do Paços
de Ferreira.
Continuamos tão frágeis como asas de borboleta numa
tempestade. Cada jogo é uma ameaça de desgraça. Continuamos a ser um problema
adiado que ameaça ruir a cada jogo.
E agora, que nos apartamos do Dragão e se aproxima um ciclo
de jogos difíceis, só espero que, de alguma forma, nem quero saber como, isto
corra bem.
Análises Individuais:
Helton – Tirando um canto em que soca a bola para trás (!), salvou o
FC Porto por três vezes.
Danilo – Tentou esticar no ataque, mas rapidamente percebeu que se
era para tentar sozinho, mais valia estar quieto. A defender, teve dificuldades
em parar Bebé e as suas arrancadas à sprinter dos 100m. A maior parte delas,
inconsequentes.
Alex Sandro – Continua a ser o melhor extremo da equipa. Sintomático. A
defender, foi muito passivo.
Abdoulaye – Não inventou e teve uma (re)estreia sólida.
Algumas dificuldades no um para um, sobretudo frente a Bebé, mas manteve a
compostura e a calma, o que é suficiente para mitigar o perigo de Bebé.
Mangala – Seguríssimo no corte e autoritário no jogo aéreo.
Fernando – Regressa em grande e é o melhor em campo. Se o
meio campo do Paços de Ferreira encostasse um pouco mais no ataque, não sei se
a história do jogo não seria outra. Felizmente, ainda há Fernando. A forma como
cria o 2-0 é brutal.
Herrera – É a boa notícia do jogo. Está a crescer na posição
8 e explode à medida que se aproxima da área contrária. Ainda tem que ganhar
fiabilidade, sobretudo no passe curto, e algum impacto no jogo, mas está no bom
caminho. Jamais será um médio defensivo.
Josué – A ligação meio campo e ataque falhou. Tem que
procurar mais bola, ser mais dinâmico, mais mexido, mais vivo. Josué procura
pegar no jogo recuando. Isso baixa o ritmo. Tem é que pegar no jogo o mais
próximo possível da sua posição. Com desmarcações rápidas entre os médios
defensivos e a linha defensiva do adversário. Alguns bons passes e pouco mais.
Varela – Jogo morno. Nem absurdamente mau, como já fez. Nem
o Varela pleno que raramente se vê. Passou muito ao lado do jogo.
Quaresma – Continua o mesmo abusado. Levando à loucura quem desespera
por uma gota de futebol neste FC Porto. Quaresma será sempre assim e não
aprende. Se aprendesse a carreira teria sido outra, como é lógico. Demasiados
lances perdidos, demasiada inconsequência. Quaresma é como a bacia do
garimpeiro. Por cada pepita, muita pedra e areia passa por lá. Por fim, não
entendo como lhe permitem marcar tudo o que é bola parada.
Jackson – Lá marcou, num jogo onde andava longe da sua valia. O jogo
não lhe chega e está a render-se à fatalidade. Maus domínios de bola e alguma
lentidão no arranque.
Quintero – Tentou fazer melhor que Josué. Trouxe alguns movimentos
individuais, mas a ligação meio campo - ataque não melhorou.
Licá – Numa substituição ousada, acaba por ser o Joker do
jogo. Só prova que no futebol a lógica é uma batata. Entra francamente mal em
campo, mas aproveita a arrancada de Fernando para assistir para o 2-0. Que
sirva para ganhar alguma moral.
Ricardo – Entrou, marcou e o árbitro apitou. Há dias assim.
Ficha de Jogo:
FC Porto: Helton, Danilo, Abdoulaye, Mangala, Alex Sandro, Herrera,
Fernando, Josué (68, Quintero), Quaresma (78, Licá), Jackson e Varela (90, Ricardo)
Suplentes: Fabiano, Maicon, Quintero, Ghilas, Licá, Ricardo e Defour
Treinador: Paulo Fonseca
Paços de Ferreira: Degra, Jailson, Flávio, Tiago Valente, Hélder Lopes, André
Leão, Rodrigo António, Seri, Bebé, Minhoca e Del Valle
Suplentes: António Filipe, Romeu, Nuno Santos, Ricardo, Sérgio
Oliveira, Fernando Neto e Manuel José
Treinador: Henrique Calisto
Árbitro: Cosme Machado (Braga)
Golos: Quaresma, aos 43 minutos, através da marcação de grande penalidade, Jackson Martinez (87) e Ricardo (90+2)
Por: Breogán
1 comentário:
Nunca vi um Porto tão pouco mandão e autoritário em casa. Qualquer equipa almeja pontuar e não censuro. Sim, este Paços está bem mais arrumadinho e organizado mas o resultado é enganoso. Aquele duplo pivôt é uma nódoa..obrigar Herrera a desaparecer criativamente em prol de uma falsa maior segurança é um crime para o clube e para o incompreendido Fernando. Este, por ventura, está bem mais completo, desde os tempos do AVB, portanto desengane-se quem pensa que o segundo golo foi produto desta nova aberração tática ou dedo do treinador. Na luz já fez isto e o treinador era o Vítor Pereira. Já agora, obrigado Fernando por teres renovado. Mesmo que partas no Verão, vais imaculado ao contrário de Paulos Assunções....
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