segunda-feira, 1 de setembro de 2014

FC Porto 3-0 Moreirense: ISTO NÃO É SQUASH.



É comum ouvir dizer que contra a maioria das equipas da Primeira Liga não é preciso mais do que um médio defensivo e que todas as cautelas são sempre demais perante equipas que jogam para o 0-0 estacionado autocarros e camionetas.

O Moreirense não foi autocarro porque não se limitou a acantonar jogadores à entrada da área mas defendeu muito (pelo campo todo) e quis atacar pouco.

Eis um teste para a velha teoria. Lopetegui fez o favor ao povo e vai Quaresma, vai Adrien, vai Brahimi no meio com apenas o levezinho Oliver a fazer companhia a Casemiro.

Equipa de ataque. Construtores, dribladores, triveladores, assistentes, cabeceadores, avançados, matadores. Estava tudo lá.

Com tudo lá, sem cautelas defensivas e contra um adversário que só quis defender.

O que falha então? Porque cai a teoria?

O Futebol não é squash. Podemos pensar que definimos melhor com mais atacantes e que a definição de qualquer jogada terá maiores probabilidades de sucesso com uma multiplicidade de jogadores talentosos. Qual é o problema?

Para definir é preciso que ocorra uma de 2 situações: ou se constrói bem desde o meio-campo ou se rouba a bola perto da área adversária.

Quanto a possibilidade de definição termina a bola não volta por natureza para nova oportunidade.

É no squash que após raquetadas a bola volta ao destinatário por mandamento divino.

No futebol é preciso ir buscá-la ou esperar que o adversário a devolva.

E aí é que a porca torce o rabo. O Moreirense troca a bola com critério embora sem espirito de baliza. Oliver deixa de ser o que sempre foi até agora: o primeiro homem a saltar na pressão porque, desta feita, é o 5.º jogador mais avançado.

Antes dele é suposto que Jackson, Adrian, Brahimi e Quaresma sejam a primeira barreira. Aquela que normalmente consegue impedir que o adversário entre no nosso meio-campo com a bola jogada.

Ao problema habitual desde o inicio da época – incapacidade de criar oportunidades em quantidade – surgem novos. Fragilidade na pressão alta, recuperação da bola em zonas mais recuadas, intensidade diminuta e poucos apoios para o inicio de construção.

A definição fica à espera que a construção ou a pressão faça o seu trabalho.

O adversário entra no nosso meio-campo e Casemiro e Danilo tentam resolver com agressividade o que a tactica estava a deixar passar. Danilo entra duro mas sem falta.

Casemiro vira dois ou três pelo caminho.

A construção tem problemas porque pelo meio não há grandes apoios. O Porto é obrigado a lateralizar já que o Moreirense inunda o eixo central de jogadores e cria uma fronteira em que Casemiro está do lado de cá, Brahimi está do lado de lá e Oliver está cá, lá, em todo o lado e em parte nenhuma.

Quando a bola é recuperada no meio-campo adversário há espaço para mais definição de jogadores como Brahimi e Jackson porque meio caminho está andado. Não é necessária uma construção da jogada de ataque. Um exemplo disso é o 2.º golo do Porto contra o Lille.

Quando se deixa que o adversário consiga percorrer metros e a bola só morre no nosso meio-campo falta uma maratona de construção para chegarmos a zonas de definição.

Se não roubamos à frente temos que empurrar a bola até lá. Construir mais.

Sem apoios de proximidade a construção bate no muro e Casemiro começa a dar os primeiros sinais do problema que se vai adensar na 2ª parte.

Se é preciso lateralizar, do lado esquerdo só nos transmitem más sensações. José Angel parece que tem a cueca molhada de tanta tremideira e Adrian não é solução para resolver problemas.

Brahimi anda pelo meio de 750 pernas, Quaresma mostra-se mais pela bola parada estudada do que por jogo jogado e é Danilo que cria os desequilibrios.

O futebol da 1ª parte teria sido paupérrimo sem Danilo e sem o craque Jackson que é obrigado a jogar a médio ofensivo para dar no último terço o que faltava a Casemiro no segundo terço: apoio de proximidade.

O nulo ao intervalo é justo. Porto não merece mais e Moreirense não quer mais.



Joga o 11 do povo e os atacantes não têm chance de brilhar. O futebol não é squash.

É preciso recuperar a bola. Ela não bate e volta. É preciso obrigar o Moreirense a encostar à área e ganhar a 2ª, 3ª e 4ª bola.

Tentar resolver pelo volume de jogo ofensivo aquilo em que a qualidade fraqueja.

A 2ª parte começa melhor. Mais ânimo injectado dos balneários por parte do Porto. Satisfação crescente do Moreirense sempre que olhavam para o relógio e percebiam que estavam empatados no Dragão na 2ª parte e que isso era um grande resultado.

O flanco esquerdo do Porto acorda e dá mais uma estrada para a baliza. José Angel vira Homem em 15 minutos e de menino assustado passa a jogar aquilo que sabe como se estivesse no recreio. Adrian, que por natureza é um acompanhador, também sobe de produção.

A melhoria do Porto é mais animica do que tactica ou exibicional. Estou convencido que se o Moreirense não estivesse tão satisfeito com o empate outro galo cantaria porque mostraram que sabem defender, pressionam alto com critério e trocam bem a bola.

Por lhes faltarem 20 metros é que foi possível ver Maicon e Indi descansados e Casemiro nervoso e acossado. Quando recebe, saltam adversários e falta-lhe tempo para decidir e apoio dos companheiros. Aí falha uma e duas vezes mostrando o lado negro do all attack.

Lopetegui assiste à melhoria da equipa e pensa que bastará o ânimo para lá chegar. Troca médio defensivo por médio defensivo.

Resulta por sorte. Numa das combinações pela ala direita Brahimi consegue passear sozinho na grande área. Grita e gesticula para Quaresma que acede a tempo . Aí entra o talento estratosférico de Brahimi no 1 vs 1 e o oportunismo de Oliver. 1-0 e jogo decidido. Daí em diante o futebol vira squash porque o Moreirense desarma mas continua sem forças para chegar à frente. Sem ser preciso muito trabalho a bola regressa rápido e alto e o Porto chega fácil a zonas de perigo.



Jackson mostra que é dos pontas de lança mais completos do mundo e pica o ponto.

Acaba 3-0 e fica a ideia de um resultado mentiroso que pode anestesiar Lopetegui e fazer com que repita esta abordagem aparentemente corajosa mas que na realidade é um perigo.

Só se chega a zonas de ataque se se ultrapassar zonas intermédias. Para lá chegar são precisos apoios. Redes de proximidade entre jogadores.

Só se ataca com bola. Para ter bola é preciso recuperar porque ela não vem ter connosco.

Isto não é squash.


Análises Individuais

Fabiano:  Não teve trabalho mas mostrou que precisa de afinar o timing de saída num lance em que fica fora da jogada num desentendimento com José Angel.

Danilo: Com Jackson é o melhor jogador do Porto na 1ª parte. Compensa o decréscimo de intensidade colectivo na procura e condução de bola com o aumento da sua agressividade habitual na disputa e implicando-se nas zonas de ataque.
É o tipo de jogador analista. Ele lê o jogo como nós vemos na TV e dá à equipa aquilo que acha que lhe está a falhar.
2.º melhor jogador do Porto na tarde de hoje.

Maicon:  Parece que encontrou o parceiro certo. O estilo autoritário e mandão de Maicon casa bem com o recato e a manhosice de Indi. A jogar assim é central para 30 milhões mas é preciso que fique claro que Martins Indi teria 40% dos direitos económicos dada a segurança que lhe dá. Rico fundo.

Martins Indi: O costume. Um relógio suiço Made in Barreiro e vendido em Roterdão.
Tranquilão, cara de mau e capaz de fazer o que é preciso. Trabalho sujo ou limpo é sempre trabalho.

José Angel: A primeira parte foi um susto. Quando o árbitro apita para o intervalo todos nós pensamos que Alex Sandro é Maradona tamanha a diferença entre a qualidade de um e a tremideira de outro.
A segunda parte foi muito boa. Mostrou que também sabe ser agressivo, que tem visão de jogo, que tem passe longo, que sabe ir à linha e apoiar.
O balanço entre o mau da 1ª parte e o bom da 2ª dá-lhe um suficiente. A rever.

Casemiro: Lopetegui fez-lhe a ele o que Casemiro fez a Ruben Neves na passada 3ª feira com aquele passe. Armadilhou-o.
Jogou mal, esteve nervoso e faltoso mas foi obrigado a errar pela tactica de Lopetegui que isolou alguém que está a dar os primeiros passos como trinco puro e único.
“Ficas sozinho e tomas conta de tudo”
Aniquilou o ponto forte do Porto no ínicio da época: A transição defensiva.
“Aguenta Casemiro.”
Tirou-lhe Ruben Neves e Herrera para apoio na 1ª fase de construção. “Safas-te Casemiro?”
Casemiro não tomou conta, não aguentou, nem se safou. Naquelas condições falhou ele como falhariam 80% dos 6 que o são desde o berço.

Oliver: Não o vejo com perfil para ser o Médio. Tem olhos, cabeça e talento para o ser.
Falta-lhe peso, experiência e pulmão para aguentar o peso duma equipa desequilibrada em que é ele que tem ligar os 5 de trás com os 4 da frente.
Passou a 1ª parte neste vai-vem em que tenta ser carne e peixe mas não se distingue em nenhuma das funções.
Melhora na 2ª parte com o contentamento do adversário com o 0-0 e acaba por ajudar a decidir o jogo empurrando para a baliza o rebuçado dado por Brahimi.

Brahimi: É tão forte nos duelos individuais que considero um pecado plantá-lo numa floresta de pernas. O argelino é forte mas será preferivel dar-lhe condições para resolver pós-drible (como fez no lance do golo) do que obrigá-lo a driblar pós-drible ou inverter a marcha pós-drible.
Brahimi não é um maestro. É um match winner.
A um match winner não podem ser dadas excessivas funções defensivas nem a batuta de todo o jogo ofensivo. 
Tem que estar fresco para resolver e não pode ser obrigado a acabar os jogos com as meias em baixo.
Bem aproveitado será uma mina de ouro.

Quaresma: Interventivo mas complicativo. Algumas boas combinações com Danilo, algumas tentativas de desequilibrio mas passaria ao lado do jogo não fosse a sua participação no lance que decide o jogo.
Levou as bancadas ao delirio quando sai com boa cara ao ser substituído.

Adrian: Está na fase pré-assobio. Naquela fase em que se vê o Adrien tentando aproveitar cada apontamento para esquecer o que era suposto que fizesse.
A compaixão pré-desespero.
Do “não pode jogar a .....” passamos ao “está melhor que....”.
Foi a melhor exibição do espanhol mas ainda é muito curto para sonhar ser titular do Porto.
1ª parte cinzenta e uma 2ª parte em que se deu aos companheiros de ataque, tabelou, desmarcou, arrancou.

Jackson: Há 2 anos que o colombiano marca muitos golos mesmo jogando numa equipa que não lhe dá muitas bolas de golo. Imagino-o num Real Madrid e não sei se a Liga Espanhola acabaria com Messi e Ronaldo no topo.
Ele marca, ele segura a bola com 2 ou 3 calmeirões ao lado, ele roda, ele assiste de calcanhar.
MVP do jogo e da época até agora.



Rúben Neves: Foi mais casual do que por mérito proprio os 3 golos de rajada depois da sua entrada por Casemiro. O que melhorou com a substituição foi a diminuição dos calafrios em zona defensiva. Rúben joga melhor a 1, 2 toques que o brasileiro.

Herrera: Entra quando o Porto está a ganhar 1-0. É a melhor fase da equipa onde o jogo se parte e Herrera pode mostrar o seu lado solar (na entrada de cabeça ao poste no lance do penalti) e o seu lado lunar (quando num contra-ataque em superiodade numérica vê o lado direito livre e passa a bola para o lado esquerdo).

Quintero: Entrou com a cara amuada ao estilo Quaresma em Lille. Com a raiva que lhe estampava o rosto saca de um cruzamento de luxo para Herrera cabecear ao poste. O árbitro marca pénalti e depois de Quaresma versão Lille vemos Nani versão Alvalade.
Logo a seguir mais duas pinceladas de talento para novo golo de Jackson.
Tem que levar um apertão de Lopetegui para aprender regras de comportamento. Caras feias só quando se está a perder.
É outro match-winner. Perde para Brahimi porque dura menos e ocupa menos relvado. No arranque/mudança de direcção é intratável mas após esse momento parece que não sai do sitio e as pernas mexem muito numa passadeira de corrida.



Ficha do jogo:

FC Porto-Moreirense, 3-0 

Primeira Liga, 3ª Jornada
Domingo, 31 Agosto 2014 - 18:00 
Estádio: Dragão, Porto 
Assistência: 35.509 

Árbitro: Bruno Esteves (Setúbal). 
Assistentes: Rui Teixeira e Mário Dionísio. 

FC PORTO: Fabiano, Danilo, Maicon, Martins Indi, José Ángel, Casemiro (Rúben Neves, 66´), Óliver Torres (Quintero, 84´), Brahimi, Ricardo Quaresma (Herrera, 75´) , Jackson Martínez, Adrián López.
Suplentes: Andrés Fernández, Ivan Marcano, Quintero , Evandro, Herrera , Ricardo, Rúben Neves. 
Treinador: Julen Lopetegui. 

MOREIRENSE: Marafona, Paulinho, Danielson, Marcelo, André Marques, Filipe Melo, André Simões, João Pedro, Arsénio (Monteiro, 76´), Alex (Cardozo, 67´), Edivaldo (Vitor Gomes, 6´). 
Suplentes: Gideão, Anilton, Diogo Cunha, Jorge Monteiro, Cardozo , Vítor Gomes, Gerso. 
Treinador: Miguel Leal. 

Ao intervalo: 0-0. 
Marcadores: Óliver Torres (70'), Jackson Martínez (82'), Jackson Martínez (87'). 
Disciplina: Danielson (6'), André Marques (53'), Marcelo (85').

Por: Walter Casagrande

2 comentários:

Anónimo disse...

Que desperdício de escriba (com todo o respeito pelo site).
Não há, nem a galáxias de distância, quem escreva assim - ou analise com esta qualidade - nos pasquins da bola ou noutro lado qualquer.
Um luxo.

Ipsuey disse...

Excelente análise, devo dar os parabéns ao blogger pela sua brilhante capacidade de dissecar o jogo e criar uma análise concisa e escrita ao nível de poucos. Tomara os nossos jornais terem alguém com um décimo do seu talento para escrever um artigo desta qualidade.

Aproveito também para pedir a sua opinião relativamente ao trio d'ataque da noite passada. Na linha do seu artigo dos "Andrades", foi gritante na noite passada a forma como os comentadores do SCP/SLB tentaram a todo o custo criar drama e catástrofe numa equipa em construção com o resultado mais francamente positivo dos 3 grandes.

Numa noite em que Sporting demonstrou que são uma equipa de meninos e em que o Benfica mostra que precisa de jogadores de qualidade, perdeu-se mais energia em tentar provar que Lopetegui tem os dias contados no Porto pela afronta de pedir reforços.

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