sábado, 16 de agosto de 2014

FC Porto - Maritimo 2-0 : MACGYVERS NÃO LEVANTAM TUFOS.





Corria a década de 80 e um novo tipo de herói entrava pelas nossas casas.




A inteligência, a criatividade e o engenho inventivo eram as únicas armas ao serviço de Macgyver. O confronto fisico era sabiamente evitado. As armas eram expressamente proibidas.

Ao ver o jogo de ontem dei por mim a pensar que temos uma equipa de MacGyvers.
Ruben, Oliver, Brahimi, Quaresma, Alex e até Jackson são estilo MacGyvers.
Passeiam pelo relvado tentando viver para a bola e evitando os adversários com ela e sem ela. Pela via do drible e do passe quando a têm,  pela movimentação fugidia quando estão em vias de a receber.

A defesa volta a ganhar mais um patrão. O vilão mauzão parece não caber numa história de MacGyvers mas Martins Indi transmite uma sensação de vigor e autoridade que tranquiliza a defesa e liberta Alex Sandro.
O meio-campo é o esperado. A única dúvida era a de saber se o rendimento da pré-época prevaleceria sobre o estatuto dos reforços.
A configuração do ataque suportou-se na mesma base. Rendimento.
A teoria dos 7+4 exposta na crónica do último jogo da pré-época revelou-se acertada.
Começa quem rende, senta quem tem que mostrar mais.
E assim começa o jogo. Ruben, Brahimi e Oliver tomam conta do palco e o relvado agradece. São o tipo de jogadores que passeiam pelo relvado com tal suavidade que nenhum tufo ousaria se levantar.
O Porto manda mas cria pouco perigo. No papel a estrutura da equipa é a de sempre.
1+2 no meio-campo e 3 jogadores abertos na frente.
Na realidade a configuração é algo estranha.
Parece que o Porto se vai aproximar do de Vitor Pereira mas isso só acontece na exiguidade de oportunidades de golo. O futebol é mais largo, as variações de flanco permanentes e a pressão menos agressiva.
O futebol é largo como procura permanente de fugir à zona de pressão. MacGyvers que têm sempre bola mas não querem confusões.
Parece que o Porto se vai aproximar do futebol espanhol de posse mas na realidade este jogo é menos associativo. Os médios jogam distantes entre si e o Porto faz um campo enorme com Oliver e Brahimi (demasiado??) longe de Ruben Neves e (demasiado??) perto das zonas laterais.
Os extremos também não tem um ponto de contacto comum.
A dupla Danilo, Quaresma fez-me lembrar os tempos de João Pinto/Jaime Magalhães. Quaresma foi médio direito à antiga seja nas tabelas, combinações ou ajuda ao companheiro.
Foi muito ala e pouco avançado. Num desses lances é criada a única oportunidade da 1ª parte para além do golo. Pinto dá para Magalhães que devolve a Pinto que remata com a esquerda para boa intervenção de Salin.
Brahimi foi James. Menos maestro da orquestra e mais performer a solo.
O golo nasce da sagacidade de um miúdo de 17 anos que trata a bola com suavidade e  matemática. Remata como passa. Com a precisão do Rocket numa mesa de snooker.
A partir daí o Porto manda, o público empolga mas o Maritimo rivaliza em jogadas de perigo. Infelizmente, ao campo grande a atacar responde o campo grande a defender. Tudo por causa do meio-campo.
El Zorro Herrera não está nos seus dias. Os MacGyvers não são polvos pittbulls e o Maritimo consegue demasiadas jogadas em que defesas vs atacantes estão em igualdade numérica e quase faz golo por Edgar Costa.






O golo do Rocket Neves faz esquecer isso tudo. A escassez de oportunidades de golo, o campo demasiado grande a defender e a falta de gente que levante tufos da relva.





Se a primeira parte tinha sido mais show off do que show on a 2ª parte começa pior.
O competente treinador do Maritimo lembra-se que se o Porto faz questão de sair assim então é capaz de ser boa ideia pressionar assado.
Metem 5, 6 jogadores no nosso meio-campo em que 3 ou 4 vão mesmo para as imediações da grande área. O Porto de Lopetegui vê o pressionar assado e não liga. 4,5,6 ou 10 mas temos que jogar assim.
Instala-se o medo. O medo não vira pânico porque os assobios acordam Lopetegui que resolve que está na hora de levantar tufo.
Entra o bicho Casemiro porque a tactica não pode tudo. É preciso um Martins Indi no meio-campo. A equipa mostra ao Maritimo que também pode jogar directo 1 ou 2 vezes e o “pressionar assado”  recolhe à base percebendo que se o Porto se adapta é capaz de ser demasiado arriscado meter 6 jogadores na nossa saída de bola.
O bicho Casemiro põe ordem no meio-campo demasiado juvenil, demasiado imaturo e em que 2 MacGyvers e 1 Zorro Errante podem mandar com bola mas não têm poder para mandar no jogo.
Para além de levantar tufo e aquecer calcanhares e tornozelos adversários o bicho tem a mesma facilidade de passe dos MacGyvers. O Porto junta o melhor da primeira parte à necessidade de presença fisica na 2ª. A equipa joga melhor e mais junta e mesmo com Ruben e Oliver com notórias dificuldades fisicas e de intensidade o desafio passa a ter só um sentido.
O Porto ataca muito, consegue criar uma ou outra oportunidade (poucas mas mais do que na 1ª parte) e o relógio vai avançando com 1-0 mas deixa de haver motivos para inquietações e ansiedades. Ser seguro atrás é o primeiro passo para ser perigoso à frente.
Lopetegui mexe sempre bem na equipa. Se é pelo meio que o Porto fraqueja é no meio que temos que dar força. Evandro por Ruben Neves e a equipa melhora porque é hora de um heroi fisico e com armas. Isto não pode ir sempre a canivete suiço. Menos MacGyvers.
Estou convencido que se Carlos Eduardo estivesse no banco a 3ª substituição seria a de Oliver.
Não podendo mexer no meio, mexe na frente. Entra Tello e aquela fase do jogo é a praia de Tello. Parecia um Formula 1 com pneus novos e tanque vazio a dar 5 segundos por volta à concorrência com pneus desgastados.
Um, dois, três arranques e a prova que Tello tem mais do que arranque. Acende a luz a Jackson que à segunda tentativa faz o 2-0 que acaba por dar uma história enganadora ao jogo.
O Porto teve demasiada bola para as oportunidades que (não) criou.
O Porto teve demasiada produtividade para as oportunidades que criou.
Se acham que estou a ser demasiado pessimista vejam o resumo de 2 minutos que passa na TV. Vejam e contem.


Análises Individuais

Fabiano:  Seguro quando o Maritimo ataca, intranquilo quando o Porto sai a atacar da defesa. Seria importante que Fabiano entrasse para cada jogo só com o intuito de fazer bem o que sabe fazer e sem a necessidade de mostrar que melhora em vertentes de jogo que não domina. Se não se centra no que sabe fazer um dia deixa de ter oportunidade de fazer o que sabe.
Danilo: Parece um uruguaio numa equipa de MacGyvers. Foi o “medio” mais agressivo na transição defensiva e encontrou em Quaresma um bom parceiro de defesa e de ataque.
Tem uma falha grave no lance em que deixa escapar Edgar Costa e esse momento retira-o da possibilidade de entrar no lote dos melhores em campo.
Maicon: Mandão, controlador e mais solto do que o parceiro do sector. Essa soltura faz com que percorra linhas de intersecção de bola estranhas. Corre demasiado risco.
Martins Indi: Mandão, durão, controlador e mais preso do que o parceiro do sector. O estar mais preso poderia ser um risco numa equipa que joga em linha alta. Felizmente Indi é o defesa que melhor domina esse conceito de jogo. Se às vezes parece estar demasiado perto de Fabiano isso é mais uma ajuda para a saída que um empecilho para a colocação em fora de jogo do adversário.
Alex Sandro: Grande jogo. Ter um defesa como este em campo permite ter um extremo como Brahimi porque Alex faz o corredor todo e preenche os espaços vazios. Defendeu com autoridade e o deslize habitual não o retira do lote dos melhores em campo.
Rúben Neves:  Quando os colegas perceberem que têm ali um médio que põe mesmo a bola onde quer e com a trajectória e a altura que quer a equipa ganhará asas. Quando ele sentir que não está em teste e que é jogador de pleno direito do Porto A essa caracteristica ficará visivel para todos. O relvado é uma mesa de Snooker para ele.
Conhece toda a movimentação sem bola para se posicionar para receber um passe. Tem olhos nas costas para adivinhar o que tem que fazer quando há pressão.
É graças ao seu golo que a leitura do jogo foi turva. Tudo pareceu melhor do que efectivamente foi. Tudo foi mais calmo do que poderia ser.
É bom não esquecer que tem 17 anos. Não garantiu segurança defensiva a 6. Menos agressivo do que deveria ser, menos preciso no posicionamente para efectuar um corte ou ganhar tempo para a equipa. É certo que os médios à frente não ajudavam mas o papel defensivo de um 6 é aprender a viver sem ajuda.
Oliver: Desmultiplicou-se no relvado tentando estar em todo o lado, tocar todas as bolas e pressionar todos. O desgaste fisico não foi proporcional à preponderância no jogo. Tal como o Rocket Neves vê tudo e põe a bola onde quer. É dos mais empenhados por genética na primeira fase de pressão. É associativo. Falta intensidade para semana sim, semana sim levar com Danilos Pereira em cima. Não precisa de levantar tufo mas tem que perceber que terá que responder em relvados que não são mesas de snooker. Como é inteligente confio que o fará.
Herrera: O jogo estava estranho para todo o meio-campo. Ruben marcou o golo , tem 17 anos e vivia o seu momento. Oliver não marcou o golo mas procura o jogo e procura a equipa. Herrera é mais de empurrar o jogo e empurrar a equipa. Como não o conseguiu fazer passou ao lado e acabou por ser, com justiça, o elo mais fraco.
Ricardo Quaresma: Gostei da aplicação, da disciplina tactica, do altruismo com bola e da expressão facial sem ela. Não foi Harry Poter nem Mágico mas provou a Lopetegui e a si mesmo que é capaz de ajudar estando desinspirado. O futebol de hoje vive muito de transpiração e inteligência.
Brahimi: Que jogão. Arranca bem , finta melhor e é praticamente impossivel tirar-lhe a bola do pé. Roda à Iniesta como se não tivesse tornozelos, arranca à Hulk como se tivesse super-poderes. Falta-lhe poder de sprint e deixar de finalizar à Atsu para ser material Bola de Ouro.
Não lhe falta nada para ser indiscutivel na equipa. Tem que jogar ali. Como falso extremo.
Foi o melhor jogador em campo de forma quase incontestada. Quase?
Jackson: Reviveu o pior do reinado de Vitor Pereira. Atacar muito e ter pouco serviço.
Um avançado como Jackson viverá sempre do jogo que lhe chega. Ontem chegou pouco e o colombiano demorou a perceber que não podia esperar e que tinha que descer.
Sempre que o fazia ajudava a desbloquear o jogo ofensivo. O problema é que a seguir ao desbloqueio não havia.....Jackson.

Casemiro: O quase de Brahimi é por causa de Casemiro. Jogou pouco mais de 30 minutos mas foi um jogador essencial para a conquista dos 3 pontos.
Esteve muito melhor do que nos jogos da pré-época. Disputou cada lance pelo chão ou pelo ar como se a titularidade disso dependesse. Levantou tufo sem que a qualidade de passe que Rocket Neves e Oliver Torres dão fosse beliscada.
Entre o Zorro e os MacGyvers alguém vai ter que sair. O Bicho tem que jogar porque sabe fazê-lo levantando tufo.
Evandro: Não percebo como se questiona a presença no plantel do brasileiro. Ontem o Porto jogou com um trio de meio-campo imaturo e juvenil na idade, no peso e na matreirice.
O Porto tem médios maduros, séniores, pesados e espertos? Se tem é por Evandro.
Ruben Neves e Oliver estavam mortos e a entrada de Evandro deu o poder necessário.
Tello: Tal como no Barcelona o impacto que tem quando todo o mundo está cansado e ele tem o turbo ligado é brutal. Tem um perfil à Quintero do tipo de jogadores que quando entram têm tudo para render. Um porque tem mais espaço para a magia. O outro porque é único capaz de comer o espaço com as pernas. Grande entrada.



Lopetegui: Escolheu a equipa de forma justa. O jogo mostrou qualidade de trabalho tactico mas dificuldades que alguns jogadores têm em se desmultiplicarem nas diversas funções que lhe são requeridas.
Leu bem o jogo e percebeu sempre o que era preciso para melhorar a equipa.
Deve olhar para o Lille e ser pragmático. Na Champions contra os devoradores de meio-campo franceses não há espaço para imaturidade, leveza e ingenuidade.
O trio de meio-campo do Porto teve tanto de engenhoso como de pueril. O Lille joga com um bicho que se chama Mavuba. Com uma motocicleta quadrada chamada Balmont. Com um lavrador como o Gueye.
Stallone, Van Damme e Schwarzeneger são capazes de ser demasiado rijos de engolir para 2 MacGyvers e 1 Zorro. Jogo de Champions não deve ser palco de experimentalismos utópicos.


Ficha de jogo:
FC Porto-Marítimo, 2-0
Primeira Liga, 1ª jornada
6ª feira, 15 Agosto 2014 - 20:00
Estádio: Dragão, Porto
Assistência: 48.036


Árbitro: Carlos Xistra (Castelo Branco).
Assistentes: Nuno Pereira e Jorge Cruz.
Quarto Árbitro: Tiago Antunes.

FC PORTO: Fabiano, Danilo, Maicon, Martins Indi, Alex Sandro, Rúben Neves, Herrera, Óliver Torres, Brahimi, Quaresma, Jackson Martínez.
Suplentes: Andrés Fernández, Reyes, Casemiro (57' Herrera), Evandro (74' Rúben Neves), Ricardo, Tello (80' Brahimi), Adrián López.
Treinador: Julen Lopetegui.

MARÍTIMO: Salin, João Diogo, Bauer, Danilo Pereira, Dyego Sousa, Edgar Costa, Gégé, Gallo, Fernando Ferreira, Fransérgio, Rúben Ferreira.
Suplentes: Welligton, Ramsteijn, Alex Soares, Weeks (65' Gallo), Kukula (72' Edgar Costa), Briguel, Mazzou (83' Fernando Ferreira).
Treinador: Leonel Pontes.

Ao intervalo: 1-0.
Marcadores: Rúben Neves (11'), Jackson Martínez (90+4').
Disciplina: Gégé (58').



Por: Walter Casagrande



3 comentários:

Anónimo disse...

Excelente cronica ao jogo.

ega disse...

Muito bem escrito e comentado com clareza e precisão. Continue.

RAM disse...

Crónica de grande nível. Parabéns!

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